sábado, 24 de julho de 2010

Marx, Rosa e Eleições 2010

Sei que essas coisas andam fora de moda e eu próprio havia me prometido não falar de política por aqui. Mas o que fazer quando um texto abre fendas em sua cabeça e toca em feridas cicatrizadas, mas nunca totalmente purgadas? O artigo de Hannah Arendt sobre Rosa Luxemburgo em Homens em tempos sombrios (Cia da Letras) me faz voltar os olhos para Marx, marxistas, leninistas e, creiam-me, as eleições de 2010. Salada demais? Talvez, mas o que me chama a atenção no artigo sobre Rosa é o ponto da sua honestidade intelectual. Aprendi ali, tardiamente, mais algumas coisas sobre por que, intuitivamente, fui abandonando o trotskismo e o marxismo dos muitos anos de minha vida. Hannah Arendt relembra a tese fundamental do livro de Rosa sobre o imperialismo (Acumulação do Capital), em que ela questiona o centro da teoria de Marx de que o capitalismo, como um sistema fechado e de acumulação de capital finito, gera sua própria destruição. Rosa achava Marx o melhor entre todos, pela ousadia de suas idéias, mas nunca professou o marxismo, nem a revolução, como fé. Em sua teoria do terceiro homem, diferentemente de Marx, ela via que o capitalismo sempre poderia buscar integrar ao sistema de acumulação grupos, povos e nações vivendo sob formas pré-capitalistas, reproduzindo-se muito além dos limites previstos por Marx. Sua própria teoria, embora ousada, também era falha, mas de todo modo dá mostras da grande flexibilidade de Rosa. Uma flexibilidade que marxistas e, depois, seus filhos mais ilustres, os leninistas de todos os matizes, abominam. Fora do sistema de idéias marxista, Schumpeter deu a chave para entender por que o capitalismo se renova e a acumulação de capital continua: a teoria da destruição criativa, ou, em outras palavras, o papel da inovação na economia de mercado. Inovação para o bem ou para o mal, digo eu, modestamente. Sim, pois o que tivemos na recente crise financeira global senão o produto de uma acumulação de capital fruto da inovação extrema dos derivativos, com os swaps de créditos? Desde que o chip, o software e o algorítimo estejam por aí, não haverá limites para jovens inteligentes e impetuosos inovarem no sistema financeiro, e fora dele também. Fala-se muito na regulação de Obama nos EUA. Ok, bom que seja assim. Mas duvido que vá segurar ou prevenir novas crises no futuro. Virão de outra forma. Mas o que eu queria dizer é que a honestidade de Rosa Luxemburgo e sua fonte moral genuína de socialismo levou-a a se bater, dentro do partido social-democrata alemão (o SPD de hoje), pela idéia de que o partido tivesse um programa republicano (lembremos que antes da 1ª Guerra Mundial a Alemanha era uma monarquia), não necessariamente um “programa máximo socialista” (ainda uma lembrança: a social-democracia alemã tinha um programa mínimo e um programa máximo). Para Rosa, “a salvação era a ‘escola da vida pública, a democracia e a opinião pública mais amplas e mais ilimitadas’”, não o terror que a tudo conspurca e corrompe. Veja-se o que virou a União Soviética e como Rosa, por antecipação, estava certa. É claro que a disjuntiva dos tempos atuais não é democracia x barbárie. E que o Brasil está muito longe de formas autoritárias. O que me incomoda é essa apatia, o vamos-do-jeito-que-está-que-assim-tá-bom. E, por favor, pensar diferente por que, se temos quase uma unanimidade? Mesmo que eu não tenha ilusões quanto a programas, fica difícil escolher entre candidatos que não dizem, verdadeiramente, o que são e o que querem. Esse clima de plebiscito não me soa honesto. Melhor, então, curtir o bom Cartola: “Não vou culpar os amigos fingidos que outrora eu tive na vida/Nem vou dizer que a razão do fracasso se prende a batalhas perdidas.”

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