quinta-feira, 15 de julho de 2010

Tão perto, tão longe

Edmundo se surpreende com o Porto Madero

Cinco décadas depois, deu-me de conhecer Buenos Aires. Em férias, vim por cinco dias, aproveitando milhas que expiravam. E eis que tenho uma bela surpresa. A ignorância, talvez até uma pontinha de preconceito, me fez conhecer o mundo antes de parar por essas bandas. Venho de um pedaço do Brasil em que dois rios, o Paranaíba e o Grande, correm em paralelo formando o triângulo de meu vasto estado; mais à frente se juntam no Rio Paraná e aqui desaguam na imensidão do Prata. A cidade tem um forte sotaque Haussmaniano, sem dúvida. As grandes e largas avenidas, como a 9 de Julio, lembram de imediato a amplitude das vias parisienses criadas pelo planejador Georges-Eugène Haussmann na segunda metade do século XIX. Inúmeras construções de teto abobadado também lembram Paris. Um belo conjunto é formado pelo Teatro Colón em face do Palácio da Justiça, onde se situa a Suprema Corte argentina. O povo parece operoso e alegre (ainda não vi o lado sombrio cantado no tango), embora um pouco retraído nesses dias de intenso frio. Não poderia ser diferente. Após quatro anos, voltou a nevar nos arredores de Buenos Aires, na fria madrugada em que o Senado, trabalhando por 14 horas seguidas, aprovou o projeto de lei instituindo o casamento gay, por 33 votos contra 27. Se bem que a igreja católica tentou, na terça-feira (13) à noite, barrar o projeto, com uma imponente manifestação diante do Congresso. Um ato bem maior do que o das organizações de esquerda, na noite seguinte, em apoio ao projeto. Mas se os senadores foram até mais de 1 hora da manhã votando a lei, e a aprovaram, é porque o ânimo das ruas era favorável. "Protestas", por sinal, fazem parte da cena cotidiana bonaerense. Ora são condutores de microonibus parados; ora profissionais da área cinematográfica, incomodados pela importação de serviços, mais em conta, feitos por mão-de-obra uruguaia. Mas também se vê professores em greve. Na TV, cenas comuns de um Brasil sem "protestas" mas com um bocado de violência. Em um dos bairros da Capital, moradores em fúria incendeiam ruas e atacam delegacia de polícia onde um jovem, apenas detido no fim de semana, apareceu enforcado. Sua mãe vocaliza o sentimento materno e o protesto dos moradores: "Queremos que  os responsáveis apareçam, são covardes. Por que se escondem? Queremos Justiça." Além desse cotidiano, ao meu programa turístico importa ir para Caminito, visitar a Bombonera, ver as glórias do Boca. Na parede com fotos de todos os seus times, vemos os brasileiros Rodrigues Neto, meia clássico dos anos 70, o lateral "Baiano" e o atacante Iarley, ambos ainda em atividade no Brasil. Cai a ficha de que estamos mais próximos do que pensamos. Em décadas diferentes, dependendo da "força" da moeda de cada um, hordas de argentinos e de brasileiros se movem de lá para cá e daqui para lá. Agora é a nossa vez com o real forte. Há uma chusma infindável de patrícios por aqui. Com o real a 1 por 2 pesos, tudo fica mais fácil. Mas melhor fariam as elites políticas dos dois lados se buscassem uma maior convergência macro e microeconômica. Uma só moeda no Mercosul, como o Euro, mas sem os equívocos fiscais da União Européia, que estão na base da crise atual, seria uma ótima idéia. Pena que a força centrífuga no Mercosul esteja, no momento, mais forte.

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